Análise: Aumento para poucos – quando a gestão pública se desconecta da realidade

Em um momento de grande dificuldade econômica, em que o Brasil enfrenta o fantasma da volta da inflação e a pobreza atinge níveis alarmantes, a proposta de um reajuste salarial de 60% para a prefeita de Ponta Grossa, Elizabeth Schmidt, e de até 100% para os secretários municipais soa desconectada da realidade de grande parte da população. Afinal, um aumento de R$ 20 mil para R$ 32 mil, de uma hora para outra, está completamente fora da realidade.
A questão é que o Brasil atravessa um período de intensa fragilidade econômica, com a inflação em patamares elevados, o aumento do custo de vida e a queda do poder de compra das famílias. A pobreza, que já era uma realidade persistente para milhões de brasileiros, se agrava ainda mais, empurrando uma parcela significativa da população para a margem da sociedade.
Em Ponta Grossa, como em muitas outras cidades do país, o quadro não é diferente. A insegurança alimentar e as dificuldades no acesso a serviços públicos de qualidade, principalmente na área da saúde e transporte, tornam ainda mais desafiadora a vida das pessoas.
Nesse contexto, a proposta de aumento salarial para os principais gestores da cidade se torna, no mínimo, polêmica. O argumento de que o reajuste é necessário para “tornar a gestão pública mais atrativa”, com a justificativa de melhorar a contratação de médicos via concursos públicos, soa desconectado das reais necessidades da população.
Embora a contratação de médicos e outros profissionais de saúde seja uma prioridade para qualquer administração pública, um aumento de salário tão expressivo para cargos políticos não parece ser a solução para problemas estruturais mais urgentes, como o atendimento à saúde, educação, infraestrutura e segurança pública.
Na realidade, os recursos que seriam destinados a esses aumentos poderiam ser muito mais bem aplicados no fortalecimento dos serviços básicos para a população, que enfrenta um colapso em diversas áreas essenciais.
Além disso, o momento da proposta não poderia ser mais questionável. O fato de o projeto ser apresentado logo após a reeleição da prefeita e sem qualquer menção a essa medida durante a campanha eleitoral gera desconfiança sobre os reais interesses por trás da proposta e até mesmo do que possa vir em seguida.
A população de Ponta Grossa, que já enfrenta dificuldades econômicas e sociais, sente-se traída por uma administração que, ao invés de focar em medidas para mitigar a pobreza e melhorar a qualidade de vida, prioriza o aumento de salários para quem já ocupa cargos de poder.
Para solucionar essa questão referente a contratação de médicos com salários melhores, sem aumentar o salário dos gestores, poderiam ter sido usadas outras alternativas:
1 – Incentivos Alternativos: Uma solução viável seria oferecer benefícios não remuneratórios, como auxílio-moradia, transporte, planos de saúde diferenciados, e até bônus por desempenho ou produtividade. Esses benefícios ajudam a atrair profissionais sem elevar o valor direto do salário, respeitando o teto.
2 – Contratação via Regime Jurídico Diferenciado: Em algumas localidades, serviços médicos e de outras áreas podem ser terceirizados ou contratados por regime de prestação de serviços, em vez de vínculos diretos. Isso permitiria maior flexibilidade na negociação dos valores sem violar o teto remuneratório.
3 – Ajustes Específicos na Legislação Municipal: Em alguns casos, câmaras municipais podem aprovar legislações locais que permitam complementos salariais específicos para determinadas áreas essenciais, justificando a excepcionalidade da remuneração com base nas necessidades locais.
4 – Estabelecimento de Gratificações Temporárias: Algumas cidades adotam o pagamento de gratificações temporárias para profissionais de áreas críticas. Essas gratificações podem ser justificadas pela escassez de mão de obra local ou pela necessidade de garantir um serviço público essencial.
5 – Contratação através de legislação específica para profissionais do setor .. com a possibilidade de contração de PPPS.
No entanto, a gestão optou por aumentar os salários, parecendo ignorar o fato de que a cidade enfrenta desafios sérios em diversas frentes, além da perda de poder aquisitivo das famílias.
É importante destacar que, enquanto os salários dos políticos aumentam consideravelmente, a grande maioria da população de Ponta Grossa, assim como a de outras cidades do Brasil, continua lutando para garantir o básico para sua sobrevivência.